A Banca Ética e Solidária e a Sustentabilidade

Joana Guedes

Vivemos numa era de consciencialização da sustentabilidade por parte da sociedade civil sem precedentes. A sociedade atual anseia e exige a implementação de práticas que respeitem e preservem os recursos disponíveis e garantam a sobrevivência das gerações vindouras. Porém, esta consciencialização em massa, que se tem alastrado às mais diversas componentes da vida quotidiana, vem associada a um enviesamento da compreensão da sustentabilidade, limitando-a à sua dimensão ambiental.


Falar-se em sustentabilidade não é falar-se apenas em ecologia. Esta associação afunilada entre sustentabilidade e ambiente foi alargada às dimensões sociais e económicas nos anos 90 e este triângulo dimensional da sustentabilidade consagrado pela ONU, em 2002, na Cimeira de Joanesburgo, mantem-se como referência até aos dias de hoje.


Assim sendo, as finanças éticas devem ser vistas como uma forma de promoção da sustentabilidade. Como assim? As finanças éticas, que integram os bancos éticos, as sociedades gestoras de fundos de investimento éticos e as sociedades gestoras de capital de risco social ou filantrópico, financiam projetos que geram diretamente bens e serviços, com impactos positivos na sociedade. Ou seja, é possível, pegando num instrumento financeiro – associado à dimensão económica – promover a sustentabilidade ambiental e social, na medida em que são financiados apenas projetos com atividades socialmente responsáveis, com pegada ecológica reduzida e cuja ação tenha impacto positivo na sociedade.

Porém, a dimensão social só ficará totalmente salvaguardada se as finanças para além de éticas forem também solidárias. Tomando como referência os bancos éticos, estes podem seguir o modelo de banca ética ou o modelo de banca ética cooperativa. Por outras palavras, são supervisionados, em termos de liquidez e transparência, pelo banco nacional do seu país,
cumprem e possuem um organograma de decisão tradicional, como o Triodos Bank; ou, detêm um sistema de gestão democrática, onde o peso do voto de cada cooperador é igual, independentemente do capital que tenha investido – “uma pessoa, um voto” – como o Oikocredit. Neste modelo, no modelo de banca ética cooperativa, é possível encontrar as finanças éticas e solidárias. Porquê? Porque as cooperativas são, por definição, organizações
da Economia Social e Solidária e, como tal, integram os princípios e valores da Economia Social e Solidária nas suas atividades, nomeadamente, o predomínio do interesse comum e do interesse geral sobre o interesse individual, o objetivo principal não é o lucro (ou a ausência dele), mas antes a solidariedade e cooperação, verificando-se o primado da pessoa sobre o
capital, uma gestão democrática, autonomia face ao Estado, na gestão e nas tomadas de decisão internas e a adesão dos membros é feita de forma voluntária.


A existência de bancos éticos é, por si só uma mais-valia, na medida em que a sua atividade fomenta o investimento em atividades benéficas para a humanidade, por contrapartida da redução do investimento em atividades nocivas e, consequentemente, quanto maior for esse investimento, maior a sua dimensão, impacto e influência nos padrões de consumo da sociedade. Porém, a sociedade atual exige mais. Se, por um lado, o avanço tecnológico
acontece de forma exponencial, por outro, milhares de pessoas estão excluídas do sistema financeiro tradicional, por se considerar que não reúnem condições para o integrarem. Destituídos de poder, estes, tendem a ser excluídos dos sistemas sociais básicos, estando privados de integrarem a sociedade na sua plenitude e condicionados a uma espiral
descendente da sua própria condição.


A sustentabilidade só existe, se existir em todas as dimensões que o conceito compreende, pelo que a promoção de uma dimensão, em detrimento das restantes, não garante a
existência de sustentabilidade no seu todo. Da mesma forma, a promoção da dimensão ambiental não garante a sustentabilidade de uma sociedade com indivíduos excluídos do sistema financeiro tradicional. Neste sentido é necessário promover uma sociedade constituída por indivíduos empoderados, com acesso aos sistemas sociais básicos, ao mercado
de trabalho, ao sistema financeiro, dando o salto para lá da dimensão ambiental, chegando à dimensão económica e à dimensão social. Uma das formas de articulação destas dimensões da sustentabilidade passa pelo fomento de bancos éticos e solidários, que se regem por princípios éticos de transparência e solidariedade onde o respeito pelo ser humano e pelo
ambiente se sobrepõe à maximização do lucro e os investimentos direcionados apenas para atividades benéficas para a sociedade.


Por Joana Guedes,
Economista Social da FESCOOP – Cooperativa para o Desenvolvimento das Finanças Éticas e
Solidárias

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