1. A última crise financeira evidenciou o perigo para os contribuintes de um sistema bancário que, entre outros aspectos, mistura a banca comercial e a banca de investimento, um sistema em que os lucros são privados mas os prejuízos são públicos. A vossa força política seria favorável a legislação que separasse a banca comercial da banca de investimento?
A privatização da banca foi a principal alavanca para a concentração e centralização da riqueza nos grandes grupos económicos, reconstituição de antigos monopólios e consolidação de novos. Por opção de sucessivos governos a banca foi deixada sem qualquer tipo de supervisão pública, arriscando assim a poupança dos portugueses e os recursos do Estado, como diversas situações da banca privada demonstram. A perda de soberania sobre o sector financeiro e na supervisão acompanha um movimento de concentração da propriedade bancária à escala da União Europeia, pelo processo nomeadamente da União Bancária, que apenas tornará mais graves os riscos sistémicos financeiros.
A banca privada desempenha um papel fundamental no desvio dos recursos nacionais para o estrangeiro, condiciona o crédito das famílias e das empresas, promove a especulação financeira e imobiliária e o desmantelamento do aparelho produtivo, enquanto ataca os direitos dos trabalhadores do sector. Ao mesmo tempo, a banca nas mãos dos grupos privados representou vultuosas perdas para o Estado, através de benefícios fiscais e ajudas públicas sem contrapartidas. Desde 2009, por sucessivas decisões de PSD, CDS e PS, o Estado disponibilizou mais de 18 mil milhões de euros de recursos públicos para fazer face aos custos da especulação e corrupção na banca privada (incluindo os valores entregues ao Fundo de Resolução) e mais de 5 mil milhões de euros na recapitalização da CGD (cujos balanços se degradaram nos processos de favorecimento do grande capital com a conivência de sucessivos governos), perfazendo um valor que já é superior a 23 mil milhões de euros.
A necessidade de consolidar o sistema bancário e conter os riscos sistémicos para a economia, assegurar efectivas supervisão e fiscalização, travar a especulação e canalizar o investimento e financiamento para a produção nacional, para a defesa da soberania nacional e para impulsionar o crescimento seguro e equilibrado, reclama que a moeda, o crédito e outros bens e actividades financeiras sejam postos sob controlo público.
Assim e no sentido de reconstituir um sector financeiro que contribua para o crescimento económico e o desenvolvimento social, assente numa banca comercial sob controlo público, onde a CGD (com absorção do Banco de Fomento) terá um papel estratégico, de maneira a permitir que Estado seja capaz de regular o sistema financeiro e de direccionar os fluxos de crédito e de financiamento, o PCP tem no seu património de intervenção e proposta um conjunto alargado de medidas, de entre as quais destacamos as seguintes:
- O desenvolvimento, a partir do Governo, do Banco de Portugal e restantes supervisores financeiros, de um conjunto de medidas de efectiva supervisão, fiscalização e inspecção permanente e minuciosa dos bancos e outras instituições financeiras;
- O desenvolvimento do conjunto de medidas políticas, técnicas e jurídicas que, a partir do diagnóstico efectuado, abram caminho a um processo de controlo público da banca comercial;
- A assumpção pelo Estado de responsabilidades de administração directa, além da Caixa Geral de Depósitos, de bancos ou outras instituições financeiras onde tenham sido alocados fundos públicos;
- A intervenção de emergência, justificada pela defesa do interesse público, na gestão de bancos privados em situação de grave insuficiência de capitais, para manutenção do funcionamento, apuramento de responsabilidades, limitação de danos e salvaguarda da economia nacional;
- A intervenção pública na segregação de componentes financeiras e não financeiras em grupos mistos, sempre que tal segregação se justifique, particularmente analisando em pormenor a exposição de instituições financeiras;
- O expurgo dos activos tóxicos e duvidosos, saneamento e consolidação dos balanços dos bancos intervencionados;
- A recapitalização e cumprimento paulatino de rácios de capitais seguros nos bancos públicos, sem prejudicar a concessão de crédito de acordo com as prioridades da política económica e social;
- A profunda reorganização, a partir do controlo público, dos objectivos, funcionamento e estrutura do sistema bancário, em benefício dos sectores produtivos, dos pequenos e médios empresários, das famílias, das populações urbanas e rurais, da economia nacional e do País;
- A inclusão, como objectivos da reorganização do sistema bancário público reforçado, da cooperação da banca com o projecto de desenvolvimento do País; do estímulo ao crescimento económico, sem obsessões dogmáticas com a inflação; da captação de poupanças para o investimento produtivo; da interdição ou penalização da especulação financeira; do crédito de incentivo ao investimento inovador, diversificador e modernizador do tecido produtivo; do crédito em condições favoráveis ao sector cooperativo e às micro, pequenas e médias empresas; do alívio das comissões e taxas cobradas aos clientes e utentes; do respeito pelos direitos, as remunerações e as condições de trabalho dos bancários.
2. Os trabalhadores a recibos verdes correspondem frequentemente a relações laborais que não estão reguladas pelo Código do Trabalho. Não se lhes aplica, designadamente, o salário mínimo nacional. Como primeiro passo na regulação da remuneração dos trabalhadores a recibos verdes, a vossa força política seria favorável a que existisse uma remuneração mínima horária garantida para os trabalhadores a recibos verdes, concretamente com um valor de 8€ por hora?
Sobre a questão colocada, julgamos importante esclarecer em primeiro lugar que os verdadeiros trabalhadores independentes não têm uma relação de prestação de serviços regulada pelo Código do Trabalho, mas sim prevista no Código Civil.
O contrato de prestação de serviços caracteriza-se por ser um contrato no qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição, ou seja, no caso de estar previsto o pagamento de um preço pela execução do serviço, este é negociado pelas partes, contrariamente ao contrato de trabalho subordinado para o qual está sempre e obrigatoriamente prevista remuneração.
Questão diferente é a diferença entre o verdadeiro trabalho independente e o falso recibo verde, isto é, uma relação de trabalho cujas características presumem um contrato de trabalho subordinado que está “camuflado” por um contrato de prestação de serviços.
A aplicação legal de um valor mínimo por hora pela prestação de serviços, apenas contribuiria para legitimar e perpetuar a precariedade relativa aos falsos recibos verdes.
São várias as propostas do PCP de combate à precariedade e aos falsos recibos, combate que assumimos como um dos objectivos centrais do nosso trabalho, com os seguintes compromissos:
- Assegurar que a um posto de trabalho permanente corresponda um contrato de trabalho efectivo;
- Impor a limitação legal dos motivos usados para a contratação a prazo e instituir um mecanismo que atribua à ACT a competência para converter em contratos sem termo os contratos celebrados em violação das normas legais e contratuais;
- Passar a efectivos os trabalhadores com vínculos precários, em falsa prestação de serviços dos falsos recibos verdes ou da externalização de serviços, estágios e bolsas de investigação científica;
- Reduzir o período experimental, revogar o regime dos contratos de trabalho de muito curta duração, bem como as normas que discriminam os jovens à procura do primeiro emprego e os desempregados de longa duração, combater o trabalho temporário.
3. Entendem que o combate às disparidades salariais traria um benefício à
sociedade ao ponto de se justificar a definição de rácios salariais,
concretamente definindo um tecto salarial em função do salário mínimo, dentro
das empresas ou sectores de actividade?
Para o PCP a questão central é garantir que o combate às disparidades salariais, ainda que através de tectos/leques salariais, resulte no aumento real dos salários de todos os trabalhadores, a começar pelos que auferem salários mais baixos, sendo uma prioridade para o PCP, o aumento geral dos salários para todos os trabalhadores, da Administração Pública e do Privado.
O PCP assume como objectivo central o aumento do SMN para 850€ mensais, bem como a contagem de todo o tempo de trabalho para as progressões e a valorização das carreiras, como estratégia essencial de valorização do trabalho, a garantia do cumprimento do principio de trabalho igual, salário igual, o combate às desigualdades e à pobreza, melhoria das condições de vida, aumento futuro das pensões de reforma e estímulo à actividade económica e à produção nacional.
A actualização/aumento dos salários e a actualização das tabelas salariais, seja na Administração Pública, seja no Privado, em sede de contratação colectiva, dependem sempre da negociação colectiva com as organizações representativas dos trabalhadores, princípio que PCP sempre defendeu e continuará a defender.
Assim, o compromisso do PCP em defender o aumento para 850 € o Salário Mínimo Nacional promove inequivocamente a melhoria das condições de vida de quem trabalha, mas tem outros impactos positivos:
- É propulsor do aumento geral dos salários, permitindo reverter a tendência de baixa da parte salarial na distribuição do rendimento nacional;
- Permite a aproximação aos salários praticados na média da UE, apesar de ainda ficar aquém do valor pago em outros países nomeadamente em Espanha;
- Dinamiza a actividade económica;
- Constitui, em articulação com a formação contínua e considerado o seu impacto na motivação dos trabalhadores, um forte impulso ao aumento da produtividade;
- Garante um aumento das contribuições para a Segurança Social e das receitas do Estado necessárias para o investimento;
- É um instrumento indispensável para combater a pobreza laboral: não há justiça social com trabalhadores pobres.
4. Os atrasos na atribuição das reformas têm sido notórios e as soluções veiculadas nunca foram eficazes na sua resolução. Que solução prática imediata defendem para resolver este problema?
Em relação aos atrasos na atribuição e deferimento de reformas, importa reconhecer que é certo que persistem casos de problemas de funcionamento da Segurança Social e da CGA.
O PCP, por sucessivas vezes, questionou e denunciou estas situações, confrontando para tanto os Srs. Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social do Governo PS e do Ex-Governo PSD/CDS sobre os problemas de funcionamento dos serviços de Segurança Social e da CGA, dado o crescente degradar das condições de qualidade destes serviços públicos essenciais às populações.
Este degradar não é mais do que o resultado das políticas que durante anos e anos estrangularam financeiramente os serviços públicos. Menos trabalhadores na Segurança Social e na CGA significa menor celeridade nas respostas às pessoas, menor capacidade de responder a comunicações escritas e de atender telefonemas – em geral, maiores dificuldades no atendimento aos beneficiários. Esta é uma situação que não é de hoje, que se arrasta há muitos anos, mas que importa encontrar soluções para lhe pôr fim, designadamente enfrentando o problema e contratando os trabalhadores em falta.
Assim, e relativamente à questão que coloca, informamos que as propostas apresentadas pelo PCP e os compromissos que assume em relação ao direito à Segurança Social para todas as gerações, são as seguintes:
- Admitir os recursos humanos necessários, melhorar a formação e qualificação profissional para aumentar imediatamente a capacidade de resposta dos serviços. Assegurar a prestação do serviço em tempo útil, com qualidade e segurança com o necessário reforço dos serviços com meios humanos, técnicos e informáticos.
- Melhorar os serviços e a protecção social para todos, através de um sistema público de Segurança Social, universal e solidário, resultante das contribuições dos rendimentos do trabalho, de mais emprego, mais estabilidade laboral e melhores salários, são simultaneamente garantia de mais e melhor Segurança Social.
- Melhorar a qualidade dos serviços prestados e aproximar a Segurança Social dos utentes.
- Completar a informatização das carreiras contributivas de cada beneficiário. Garantir, estabilizar e concretizar a cooperação e apoio do Estado às actividades e projectos dos Centros de Cultura e Desporto da Segurança Social. Garantir o direito de informação aos beneficiários e aos cidadãos, nomeadamente a informação discriminada aos pensionistas do valor líquido das suas pensões e dos cálculos efectuados por parte do Centro Nacional de Pensões.
- Reforçar a informação sobre a Segurança Social em todas as vertentes, incluindo a transparência do Orçamento do Estado e da Conta da Segurança Social com a desagregação da informação que permita conhecer a situação financeira dos vários regimes e sub-regimes da Segurança Social e a publicação sem atrasos da Conta da Segurança Social; criação de um Sistema de Estatísticas da Segurança Social. Cumprir o direito de participação dos trabalhadores e das suas organizações representativas na definição das políticas da Segurança Social, designadamente no Conselho Consultivo do IGFSS.
- Reforçar e ampliar o financiamento da Segurança Social.
- Ampliar os meios financeiros do Sistema Previdencial através do aprofundamento da diversificação das suas fontes de financiamento. Promover um efectivo combate à evasão e dívida contributiva, incluindo prescrição das dívidas através de planos plurianuais específicos.
- Pôr fim à política de utilização das receitas da Segurança Social como instrumento de política económica. Promover uma gestão pública cuidada e criteriosa do FEFSS e promover o seu reforço por via da afectação, complementarmente, de 0,25% da receita de imposto a criar sobre as transacções financeiras e medidas que visem uma acumulação regular de reservas no FEFSS.
- Reforçar as receitas da Segurança Social.